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26 – Existiu uma “Escola Sofística” ou de Sofística?

Sofística

(uma biografia do conhecimento)

 

26 – Existiu uma “Escola Sofística” ou de Sofística?

 

O que foi sofística grega?

Podemos dizer que não foi nada e foi tudo ao mesmo tempo!

Não foi nada por nunca ter existido um “movimento organizado” em que seus integrantes, no futuro, pudessem vir a ser conhecidos como integrantes do mesmo!

Nunca existiu uma escola dos sofistas, nos termos que existiram outras escolas gregas, como a Academia e Stoá, por exemplo.

Os que hoje conhecemos por sofistas não se juntaram em uma confraria onde pudessem expor e ensinar suas ideias.

Tudo isso fica mais claro quando observamos o seguinte: Protágoras era de Abdera; Górgias de Leontino, na Magna Grécia (hoje Itália); Pródico de Céos e Hípias de Élis. Ou seja, nem um destes era ateniense, mas acorreram para Atenas para aí ensinarem. Assim, já chegaram professores de suas artes: o discurso.

Aristóteles foi para Atenas estudar com Platão, este era discípulo de Sócrates... os sofistas já chegaram em Antenas, vindo de outras cidades/colônias gregas como mestres.

Como, então, dizer-se que formavam um movimento homogêneo?

Nos parece que foram homens com visões diversas de mundo que passaram a contestar o pensamento então imperante/dominante na Atenas do século V a.e.a.

Por esse poder contestatório/modificativo do status quo, os sofistas foram agrupados, com malícia, de modo a dar a entender que formavam um movimento coeso, amalgamado em ideias comuns, o que, em princípio, não é correto afirmar.

Existiu uma única Sofística, a Grega, assim seria um erro, portanto, falar em segunda sofística. Entretanto, erro ou não, continua-se falando em uma “Segunda Sofística”, sendo esta um movimento surgido no seio do Império Romano, cerca de sete séculos depois daquela (Século II da era atual, ou seja, 700 anos depois da primeira, e estava voltada quase que exclusivamente para a Retórica).

 

Por último [...], não fizemos intervir nunca o que se chamou de segunda sofística, ou melhor, um movimento intelectual baseado na retórica e inspirado no exemplo dos sofistas do século V. Esta segunda sofística se situa no século II d. C., ou seja, sete séculos depois da primeira, que é a que nos ocupa, e a que veio bem depois está muito mais consagrada à retórica que a primeira e muito mais aberta às tendências irracionais que floresciam naquela época. Repetimos que para quem reflete sobre a retórica ou sobre a linguagem, esta aproximação tenha interesse, porém não tem para quem busca compreender o que aconteceu e se pensou na Atenas do século V.”. (Fonte: Os grandes sofistas da Atenas de Péricles. Jacqueline de Romilly. Tradução: Osório Silva Barbosa Sobrinho. Octavo. São Paulo. 2017, p 41).

 

Aqui nos interessa, a princípio, apenas o movimento grego do Século V antes da era atual. Da dita “Segunda Sofística” nos utilizaremos, se for o caso, apenas para tentar melhor esclarecer a “primeira”.

Todo a produção intelectual dos Sofistas, hoje, não passam de cerca de vinte páginas! Todas elas, regra geral, oriunda do punho de seus detratores.

Se não temos os contextos para os fragmentos que conhecemos, de alguns Sofistas temos apenas um único nome, sem qualquer outra informação sobre eles.

Fontes indiretas, como os escritos sobre medicina, as peças de teatro (tragédias e comédias) e a historiografia gregas são o que de melhor nos levam a conhecer a força das doutrinas dos Sofistas, pois apesar de não as explicarem, as estudarem, pois não era esse seu objetivo, usam largamente o que eram ensinado pelos mestres das palavras.

Vindo das mais diversas cidades gregas, já com idades avançadas, pode-se afirmar em decorrência dos cargos de embaixadores, regra geral, que exerciam, se encontram e impulsionam um elo aparentemente aleatório, a não ser pela coerência, que os une, pois suas doutrinas vão se encaixando como as peças de um brinquedo lego, sem que tenham sido produzidas com essa finalidade, mas cuja quase harmonia é largamente percebida pelos autores que se preocupam em conhecê-los devidamente.

Assim é que Górgias, por exemplo, vai em ajuda e, aparentemente sem querer, acaba por justificar Protágoras, e este dá solução para o problema posto por Górgias, numa anacronia singular.

A demonstrar que a escola que formaram decorreu dos acasos do destino, é que de todo o grupo apenas dois de seus integrantes eram atenienses: Antifonte e Hípias, a despeito do movimento ter-se projetado e atuado mais firmemente nessa cidade grega.

A denominação de pré-socráticos foi-lhes atribuída muito tempo após a existência desse grupo de pensadores, denominação que passou a abarcar TODOS aqueles que antecederam Sócrates, pondo num cesto comum pensadores tão díspares. O que é uma incorreção e uma injustiça, pois a filosofia produzida pelos Sofistas difere totalmente daquelas expostas por seus antecessores, que são chamados, também, de “filósofos da natureza” ou “físicos”. Os Sofistas, por sua vez, voltaram seus estudos para o homem, como ele pensa e a age, abandonando, assim, a “física”, mas este fato é, maliciosamente, ignorado ou escondido por grande número de historiadores da filosofia e mesmo por filósofos, de quem não se esperava tamanha má-fé!

Aliás, para Aristófanes, por exemplo, Sócrates era um Sofistas também, como expõe na sua peça As nuvens. Aliás, os filósofos e historiadores da filosofia mentem quando dizem que Aristófanes tratou Sócrates como sofista apena na peça citada! É que na peça: As rãs, volta a repetir a acusação e, para quem quer ver além de crer, sabe que o sábio e sagaz Aristófanes jamais cometeria o mesmo erro duas vezes.

Honestamente, acredita-se que a filosofia deve ser dividida apenas em duas partes: os filósofos da natureza e os filósofos humanistas, sendo o primeiro daqueles Tales e o destes o sofista Protágoras. Todos os que vieram depois, de um modo ou de outro, apenas deram, ou tentaram dar, continuidade ao pensamento dos Sofistas, no que nenhum deles, até agora, obteve sucesso!

Aliás, diz, injustamente, Alfred North Whitehead que: “Toda a filosofia ocidental não passa de notas de rodapé das páginas de Platão”.

Por que injustamente?

Porque Platão, basta que se veja os títulos de seus diálogos (muitos com o nome de sofistas, como Protágoras, Górgias, Hípias, O Sofista etc.), nada mais fez que tentar combater os Sofistas! Embora sem sucesso, repita-se!

 

Nos diz Guthrie:

 

Os sofistas não formaram uma escola.

 

Os sofistas eram, com efeito, individualistas, e até rivais, competindo entre si por favor público. Não se pode, pois, falar deles como escola. De outro lado, pretender que filosoficamente nada tinham em comum é ir longe. Partilhavam da perspectiva filosófica geral descrita na introdução sob o nome de empirismo, e com este ia ceticismo comum sobre a possibilidade de conhecimento certo, em razão tanto da inadequação e falibilidade de nossas faculdades como da ausência de uma realidade estável para ser conhecida. Todos igualmente acreditavam na antítese entre natureza e convenção. Podem diferir em sua avaliação do valor relativo de uma, mas nenhum deles sustentaria que leis, costumes e crenças religiosos humanos eram inabaláveis porque enraizados numa ordem natural imutável. Estas crenças — ou falta de crenças — eram partilhadas por outros que não eram sofistas profissionais, mas caíram sob sua influência: Tucídides, o historiador; Eurípedes, o poeta trágico; Crítias, o aristocrata, que também escreveu dramas, mas foi um dos mais violentos dos Trinta Tiranos de 404 a.C. Nesta aplicação mais ampla, é perfeitamente justificável falar de mentalidade sofista ou de movimento sofista no pensamento.” [Osório diz: este parágrafo está muito bom!]

[O “todos igualmente” acima diz que: Isso está expressamente atestado para Protágoras, Górgias, Hípias e Antífon, e pode-se afirmar com confiança de Pródico, que partilhava da idéia de Protágoras acerca das metas práticas de sua instrução (Platão, Rep. 600c-d). Pode-se mostrar em sofistas posteriores como Alcidamas e Licófron, e seria difícil produzir claro exemplo contrário.”]. (Fonte: Os sofistas, W. K. C. Guthrie, tradução, João Rezende Costa, Paulus, São Paulo, 1995, p. 49).

 

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